2010/10/24

Autoestradas da distracção

Dois doutorandos portugueses, orientados por um professor de Carnegie Mellon, decidiram estudar o impacto da rede de banda larga no desempenho das escolas portuguesas. Para isso relacionaram o tráfego de internet médio por aluno com os resultados nos exames nacionais. O principal resultado é este:
«Therefore, our results seem to suggest that broadband use in school is generally detrimental for students' performance, at least during the years right after its introduction into the school's environment. Certainly, schools need to adapt to fully benefit from this new technology. Such adaptation is a complex process that might hardly yield positive results in the short-term

Para quem precisa de tradução - em média, quanto maior o tráfego por aluno, piores os resultados escolares. O resultado é consistente com um estudo americano de que já dei conta no meu blogue há uns meses (v. aqui): a intensidade de utilização da internet está correlacionada com utilizações que distraem os alunos da função que deveria ser primordial - aprender!
A concordância entre os resultados destes dois estudos é ainda mais evidente se utilizarmos os perfis dos alunos e das escolas para controlar a relação entre tráfego e desempenho:
  1. O efeito negativo do tráfego sobre o desempenho é de magnitude considerável e estatisticamente significativo nos rapazes, mas não é estatisticamente significativo nas raparigas.
  2. O efeito negativo do tráfego sobre o desempenho é de magnitude considerável e estatisticamente significativo nas escolas que já tinham piores resultados em 2005, mas não é estatisticamente significativo nas escolas que em 2005 tinham melhores notas.
Daí que «Our results seem to indicate that merely providing broadband is not enough. Poor performing schools are more likely to have a loose Internet use policy creating an environment where Internet is utilized for entertainment and leisure as opposed to complement learning. Thus broadband can be a distraction in school, adversely affecting already poor performing schools and widening the performance gap instead of bridging it».
Portanto, conclusões concordantes com aquilo que escrevi no Beijós XXI em 2008 - a principal função do computador na escola é lúdica. Os bons alunos, sobretudo os que provêm de famílias onde os pais têm competências informáticas, poderão tirar benefícios da banda larga na escola. Para os alunos mais fracos, sobretudo os rapazes que frequentam as escolas que já tinham maus resultados antes da banda larga, a internet é prejudicial.

12 comentários:

  1. Resumindo e concluindo, os alunos mais fracos, sobretudos os rapazes, e as escolas menos exigentes, sofrem com a utilização indisciplinada da Internet?
    Quer dizer, quem não sabe aprender, aprende ainda menos com acesso livre à Internet?
    Sendo assim, o problema não é a Internet em si mas a flata de disciplina e exigência.

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  2. Eu sou do tempo... em que os rapazes (sempre os rapazes) se distraiam a ler livros aos quadradinhos debaixo da mesa.

    A professora de matemática, a D. Laura Quintela, disparava uma das suas perguntas certeiras, eles diziam que não sabiam, não tinham compreendido.

    Pairava então a pergunta: "Vais admitir que estavas distraído ou preferes passar por burro?

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  3. Logo, um bom corte na despesa que se fazia era acabar com as doações - nalguns casos - e com o financiamento quase integral - noutros casos - dos computadores para estudantes.

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  4. E os professores não têm responsabilidade nenhuma? Os mesmos que fogem da avaliação como o diabo da cruz.
    É caso para dizer quem tem medo da avaliação?
    O melhor é acabar com a Internet, mais uma vez a culpa é do Socrates, que foi só o maior obreiro das novas tecnologias,que ao que parece veio prejudicar os nossos meninos, santa ignorançia.

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  5. Ignorância é dar dois erros ortográficos na palavra ignorância.
    A internet é, realmente, um instrumento com múltiplas utilizações, incluindo a aprendizagem, mas, como com qualquer outro instrumento, só aprende quem quer.
    http://www.educacao.te.pt/jovem/index.jsp?p=115&idArtigo=222.

    Sócrates é culpado de muita coisa, mas não foi ele que inventou a internet. Eu utilizo a internet desde 1991 e utilizo-a para ensinar desde 1997, sempre com a consciência - e a experiência! - de que sem o meu esforço para ensinar e sem a vontade dos alunos aprenderem, os resultados só podem ser piores.

    Para mim, o resultado mais importante do estudo que aqui citei, na linha de outros que utilizaram metodologias diversas, é que a utilização das TIC em ensino-aprendizagem está a «widening the performance gap instead of bridging it». Não é muito correcto usar - em larga escala! - dinheiro dos contribuintes para promover este resultado. A solução não é "acabar com a internet", é utilizá-la em situações pedagógicas específicas, adaptadas ao nível de ensino, e sem recurso à distribuição massiva de brinquedos electrónicos.

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  6. Obrigado, acredite que lhe fico deveras agradecido por ter tido a amabilidade de ter corrigido esta minha ignorãncia.

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  7. E menos correcto ainda é o governo ter consciência do erro e continuar a repeti-lo.

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  8. Desculpem, mas não concordo. O facto das meninas não se distrairem tanto com a internet como os rapazes ( depende dos rapazes e das raparigas), isso não quer dizer que a utilização já na escola dos computadores não seja fundamental. Esta reacção faz-me recordar a resistência que foi feita às máquinas calculadoras.
    Os professores devem estar é mais atentos nas aulas aos distraídos(...), sejam rapazes ou raparigas.
    Caramba...não vedem a modernidade aos rapazes só porque eles brincam mais que as raparigas aos computadores. Será?!...
    Esta para mim foi uma boa medida...o resto são estudos da concorrência que já conhecemos bem!...

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  9. A Internet deve ficar reservada a meia dúzia de predestinados, aos GURUS, aos outros uma ardósia e um lápis de pedra serve muito bem. Sempre houve e sempre irá haver os velhos do restelo,sempre contra qualquer tipo de evolução.

    Os alunos de ontem são os professores de hoje, os alunos de hoje serão os professores de amanhã, como alunos são maus como profs. todos se acham excelentes, por isso são contra a avaliação, progressões automáticas, reformas gordas, etc.
    Todos nós somos avaliados no nosso dia-a-dia para puder-mos progredir na carreira, mas estes não precisam são todos excelentes, por isso mais uma vez deixo a pergunta.
    Quem tem medo da avaliação?
    Os bons não serão conserteza, e eu até conheço alguns, que se sentem prejudicados em relação aos maus colegas.

    Ps.Desculpem qualquer erro ortográfico da minha parte, é que eu além de estar ligado profissionalmente ao ensino superior, desde 92 não sou professor, deixo essa tarefa aos predestinados, que na falta de argumentos no debate de ideias, tentam diminuir os outros com os erros ou até com as gravatas.

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  10. o comentário das 18:58 deixa bem claro o que devia ter sido dito noutras ocasiões, noutros comentários.
    O que é que tem os computadores/internet de mal?
    Só devia ser para alguns? Para lhe ser dada elevada importância.

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  11. Anónimo,
    a bem da coerência, você podia decidir se me agradece pela "amabilidade" (12:26) ou se me acusa de o "tentar diminuir" (18:58).
    Quando reparei que clicou 17 vezes no link para a pág. que explica quando deve usar cedilha, convenci-me de que o seu agradecimento era sincero.

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  12. Parece-me necessário esclarecer que quando escrevi no post «Para os alunos mais fracos, sobretudo os rapazes que frequentam as escolas que já tinham maus resultados antes da banda larga, a internet é prejudicial», não estava a emitir uma opinião, estava a divulgar aquilo que é agora, até prova encontrário, uma evidência científica.

    Os dados usados pelos investigadores não são fruto de uma conspiração obscura, são dados públicos, disponíveis para quem queira repetir o estudo - tráfego da internet nas escolas (dados da FCCN) e notas dos exames nacionais (dados do ME).

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