2021/06/26

 

20 anos de poluição sobre 3 mil anos de História. Até quando?

 Beijós, sede da freguesia com o mesmo nome, com mais de 3 mil anos de História, situa-se na confluência de duas ribeiras, A Ribeira do Pisão e a Ribeira de Travassos. A Ribeira de Travassos atravessa o centro da aldeia, com passagem por baixo de uma das seis (6) pontes que ostenta um belíssimo arco todo em granito, bem trabalhado a cinzel, na estrada que liga Cabanas de Viriato, Beijós, Caldas de Sangemil a Viseu. As duas importantes ribeiras, a do Pisão e a de Travassos, encontram-se e reforçam-se ainda dentro do perímetro da povoação de Beijós, indo desaguar o rio Dão (margem esquerda), a montante de Ferreirós do Dão e da barragem da Aguieira.

Junto a essa ponte (Ribeira de Travassos), bem na zona histórica da aldeia, fica o famoso “Poço da Relva”, enquadrado por duas levadas que dantes forneciam energia para moinhos laterais e levavam a água (e ainda levam) para os prados circundantes nas duas margens da ribeira. Este cenário idílico de levadas (construções milenares para irrigação dos terrenos circundantes, para mover os moinhos de cereais, pisões de tratamento do linho e para mover vários lagares de azeite que existiram em Beijós), com as suas pequenas e grandes cascatas, ainda se pode admirar em mais de uma dezena de lugares nestas duas importantes ribeiras que “abraçam” Beijós.

A Ribeira de Travassos e a Ribeira do Pisão (nome que vem da existência antiga de pisões do linho e tratamento da lã que os teares domésticos depois transformavam em tecido para o vestuário caseiro) tornam-se numa só, a Ribeira de Beijós.

Mas é no “Poço da Relva”, visto nesta imagem,  que se pode verificar o triste efeito das descargas poluentes com origem, há muito identificada e assumida, no município de Nelas.

A Ribeira de Travassos (Beijós) era um curso de água límpida, absolutamente transparente, com vários nascentes naturais ao longo do seu curso que fornecia água para diversos usos das populações (agricultura, alimentar o gado, banhos da garotada quando o calor apertava, etc) mesmo quando o caudal desaparecia com a estiagem.

Muitos dos ainda vivos aprenderam a nadar tanto no “Poço da Relva” como noutras zonas das duas ribeiras. A boa qualidade da água promovia uma profusão de vida selvagem: peixes de 20 a 30 cm de comprimento, enguias que podiam atingir um metro de comprimento, lontras, galinholas, inúmeros anfíbios e outros animais aquáticos.

Toda essa vida selvagem praticamente desapareceu e até os limos (plantas com raiz no leito aquático) verdejantes e floridos, local predileto das rãs para um coaxar estridente e  que eram sinal da boa qualidade da água, raramente se encontram.

Não é exagero dizer que a Ribeira de Travassos e a parte jusante da Ribeira do Pisão, estão mortas, fruto da poluição química que vem do concelho de Nelas.

Mas é perfeitamente possível recuperar a boa qualidade das ribeiras de Beijós. Porém, isso não é viável enquanto continuarem com os verdadeiros e sucessivos crimes ambientais que, nas última duas décadas, têm afetado as ribeiras de Beijós, particularmente a Ribeira de Travassos.

As descargas poluentes, com origem no município de Nelas, são um grave problema de saúde pública para todos os municípios a jusante, Carregal do Sal, Tondela, Santa Comba Dão , barragem da Aguieira e toda a bacia do Mondego até  à Figueira da Foz.  A Povoação de Beijós é a principal afetada na sua saúde, na sua economia, no seu ambiente.

Beijós, e toda esta vasta zona do município de Carregal do Sal, do município de Tondela, do município de Santa Comba Dão tem todas as condições para ser uma região rural de eleição em termos ambientais e económicos.

Mas enfrentamos um verdadeiro “monstro” que é a poluição química, com origem no município de Nelas.

No espírito das pessoas locais é visível um sentimento de revolta por verem a água da ribeira que sempre usaram é algo a que agora têm que virar costas porque receiam, particularmente, pela sua saúde.

Revolta, mas também descrença nas autoridades. Descrença nas autoridades locais por ineficácia, mas também descrença no Ministério do Ambiente e seus apêndices regionais ou  GNR do ambiente. Todos conhecedores, há muito, desta situação inaceitável.

Por isso, um apelo à população para que una esforços para exigir uma solução imediata e duradoura e, eventualmente, para apresentar a fatura por tantos prejuízos causados por quem pensa que pode ter bons lucros á custa de outros ou resolver os seus problemas com falsas soluções sem querer saber quem os paga.

Esperamos que os autarcas das freguesias e dos municípios afetados, uma vez por todas, ponham os pés a caminho para exigir soluções reais e definitivas para este magno problema digno de um país rasca, mole e de cócoras perante incompetências e interesses de legitimidade duvidosa.

Mais de 20 anos de palavreado e de promessas. Disso estamos fartos.

António Abrantes

Economista

Beijós, Carregal do Sal

26 de junho de 2021

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